Emitimos
Luz
Inúmeras entradas no Sr.
Google nos conduzem para
artigos mais ou menos científicos sobre o facto de o
corpo humano emitir luz ou de, pelo menos, ter essa capacidade.
Não me
detive muito sobre essas dissertações. Para mim não constituem quaisquer
novidades. Até pensava e continuo a pensar que uma das nossas grandes funções,
ao longo da breve peregrinação que fazemos entre a medida da humanidade (pois
que o Homem continua a ser a medida de todas as coisas), seria ser luz.
Ponte do Poço de Santiago (foto de Bigorna) |
Emitir Luz talvez nem seja,
mesmo, exclusiva capacidade, dos humanos. Os mesmos processos bioquímicos que
explicam a bioluminescência, nos humanos, são comuns a muitos outros seres
vivos dos quatro cantos da taxonomia.
O que me apaga a luz dos dias e me faz as noites sombrias e solitários é o que fazemos com a nossa luz e com a luz dos outros. Como cuidamos da “conta” da luz de cada um e o que fazemos para ofuscar ou propalar essa luz, que conta damos dela, que conta vamos dar da conta de tanta falta de conta.
(foto de Bigorna) |
E já nem falo de conhecimento,
de cultura, de recriação, de fraternidade… Que dessa luz só os astrofísicos
poderão dar conto, quando do futuro observarem a quantidade de luz da Via
Lactea e disserem:
- Neste momento, a humanidade
estava e emitir pouca luz… Que pena! Os Deuses haverão de fazer-nos pagar por
isso.
Andava eu às voltas com este
remorso, em ensejos lânguidos de jiboiar pelas estradas com a minha Deolinda e
a minha Joana. Para quem não sabe, duas companheiras que nunca rangem os
dentes, não se “afermentam” comigo e não rasgam as vestes da indignação por eu ter
desprendido flato num dia de pouca ventosidade atmosférica. Como ia dizendo,
andava eu curvando boas curvas e vendo o que de belo os meus olhos são capazes
de ver como belo, quando me admirei de avistar a bela ponte centenária do Poço
de Santiago. Bela. Uma peça arquitectónica sublime.
Assim a vi e assim me atirei
ao rio para lhe captar o melhor sorriso possível, com ajuda da lente arguta da
minha Joana (a máquina fotográfica), entre mil perigos, ainda que o Vouga, por
aqueles dias fosse apenas um manso regato compassado e desmilinguido. Parecendo
que não foi arriscado! Aprendi a nadar tardiamente e nunca para me atirar à
agua, mas sim e só para o mero fatídico acaso de lá tombar.
Voltava eu das aguas revoltas
onde me aventurei, por loucura e paixão, quando vislumbrei, na margem, um casal
de meia idade, em disfarçado passeio de namorisco. Atirei o olho por cima do
ombro e ainda percebi uma cotovelada dela sobre a pança dele:
- Vês, os estrangeiros (que um
deles seria eu), vêm muito fotografar a nossa ponte. A nossa ponte é muito
FOTOVOLTAICA! Não achas?
Ri para dentro. Devo ter rido
da minha ignorância, pensava mesmo que ela queria dizer fotogénica. Até
partilhei o sucedido com alguns amigos…
Mas a senhora tinha toda a
razão e eu não lhe percebi o alcance. A Ponte, de tão linda que é, EMITE LUZ.
Uma ponte é sempre uma ponte.
Mas uma ponte, cuja estética transforma o objecto em mais que um objecto, é uma
Obra de Arte.
Enfim, uma outra forma de
emitirmos luz.
Bigorna, Outubro de 2022