“É solitário andar
por entre a gente…”
Mas não é um
contentamento descontente.
Às vezes
passamos uns pelos outros como formigas de formigueiros de outra galáxia ou
mesmo de outro universo.
Não sei, nestes
momentos de revolta, de insegurança e até de medo, de isolamento, se o que mais
nos faz mais faltam são os abraços e os beijos ou os apertos de mão, ou se bem
pelo contrário nos faz falta saber estar com os outros incondicionalmente, sem
o casaco da indiferença ou o sobretudo da arrogância ou o chapéu do preconceito
e do pútrido sentimento de superioridade miserável e mesquinho.
Hoje fui ao
supermercado e, na distância que obrigatoriamente nos deve separar, senti um
frio nos ossos e uma falta de dizer bom dia, como no poema de Luís Vale,
Primavera:
“Apetece-me (…) apertar fraternalmente ao
coração todos os homens, contar todas as fábulas que sei, desfazer todos os
mitos que descobri (…)
Ah como gosto da
minha sombra, como procuro mantê-la colada aos meus pés, como se por vezes
fosse a única companhia que tenho…. Foi o que senti.
Espero conseguir
dizer-vos, a todos, o quanto me é necessário o vosso sucesso, a vossa saúde, o
vosso bem-estar, a vossa felicidade, até, eventual e tragicamente a vossa morte
serena e sem sofrimentos (que espero bem longínqua).
À distância do onde
estamos, mas como se fosseis a sombra colada aos meus pés, quero dizer-vos que quero
dar-vos a mão e redimir-me, o quanto possa ser a vossa generosidade, porque
tantas vezes:
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Esteva - Cistus Crispus (foto de Bigorna) |
Não Te dei a Mão
Desci, na vertigem da revolta,
o vale da vida perdida e solta.
Subi o serro sombrio da solidão,
na voragem frívola e oca da ilusão.
E nem assim entendi a vida.
Nem tampouco a servidão desmedida
ou a falta que faz o perdão
e uma mão cheia de utopia.
Pisei corpos caídos na berma do trilho,
cadáveres queimados pelo medo,
embrenhados na vereda do sarilho,
restos de um mundo, cambado e azedo,
ossadas nuas… Sem fundo sem zelo e sem brilho.
Mas nada me quedou.
Nada me turvou a vista.
Nada, do intrépido, me amputou
à surdez egoísta.
A náusea pútrida não me enjoou,
nem me refreou a sede da conquista.
Corri! Crente que fintaria a realidade.
Fugi… Mas colou-se-me aos pés a verdade,
que agora arrasto, como se fora um grilhão,
sem rosto e sem vaidade.
E dói-me por dentro a minha ausência,
o intento, a fome negra da razão.
Vejo, no delubro, seres tombados, de fome, miséria e tormento.
Descubro homens esfarrapados, crianças e velhos,
que, dormindo ao relento,
se arrastam descalços, com as esperanças despidas e atadas à
cintura…
Sem remédio, sem tento e sem cura…
Com a vontade amputada pelos joelhos.
Poema de Bigorna