sábado, 25 de abril de 2020


Viva O 25 de Abril

Há 46 anos atrás, eu tinha 7 anos de idade. Não tinha luz eléctrica em casa, nem televisor, nem entendimento para saber o que era uma ditadura nem uma revolução.
Fotografia de Bigorna (... Num campo qualquer)
Tinha um pequeno transístor, que funcionava com pilhas, que fazia companhia a toda a família, nos serões e logo pela manhã, quando minha mãe fazia o almoço que meu pai levaria para o trabalho.
Eu, levantava-me pelas 6 horas e ouvia rádio, às vezes entendia e outras vezes também não, mas ouvia. Naquele dia havia música, nunca tinha ouvido aquela música, falava de uma tal Grândola Morena. Pensei, algum tempo, que que era uma menina… E até era, engraçado.
Percebi no rosto de meus pais um olhar grave e preocupado, mas ao mesmo tempo de admiração e expectativa. Havia uma revolução, lá em Lisboa. Para mim, devia ser tão longe, tão distante, talvez várias vezes a distância que separava a minha aldeia da sede de Concelho, e era quase uma hora a andar bem. A revolução não chegaria cá… Assim pensei e assim me atirei ao pequeno almoço. Minha mãe enchia a lancheira de meu pai, o que não cabia nela era o meu pequeno almoço. Claro que ela já fazia um pouco mais para sobrar. Obrigado Mãe… Hábitos rústicos, para alguns, hábitos saudáveis para o que agora sabemos. Pequeno almoço à séria.
Meu pai recomendou a meu irmão que não fosse pela estrada habitual, no caminho para a escola, a tal hora de caminho. Pode ser perigoso, não se sabe o que aquilo pode dar! Poucos minutos depois percebemos que era melhor ficar em casa. Não houve escola, nesse dia.
Minha mãe, meu avô e minha avó, foram semear uma terra de milho. Levámos o transístor. Na hora de passar a grade na terra, puxada pelos meus avós e pela minha mãe, eu substitui a pedra que se colocava em cima da grade, para fazer peso, e transportei o transístor. Trabalho duro, puxar a grade. Normalmente feito por animais de tracção, para quem tinha posses…
Fui ouvindo, muitas e muitas coisas, tenho muito boa e muito boas memórias. A maior de todas elas, que juro só voltei a escavar, da cachimónia, passados alguns anos, foi ouvir meu avô dizer: “Se isto pegar, vou negociar com o patrão (era o dono das terra, mas parecia o dono da Terra), para lhe pagar menos medidas de milho, já não vou ter medo que me ameasse, com a prisão, só por lhe pedir o que é justo!”.
Eram quarenta medidas de milho por ano (quarenta alqueires), a renda. O suor que a terra bebia, sugava-o o dono da terra. Morreu e levou as mãos nuas, afinal…
Não mudou muito. Porra!
Os anos passaram. A escola não foi a melhor… Muitos de nós não percebemos que “Eles ainda andem aí”.
Mas, é possível escrever o que escrevi (mesmo em desacordo com o acordo). É possível falar. É possível emitir opiniões. É possível ir ao médico sem ter que vender tudo até às cuecas.
Cresci, tento fazer da terra uma terra de fraternidade. O povo não é quem mais ordena. Não porque não deva, mas porque não sabe e quem ordena quer que pareça que o povo ordena ser submisso. Colonizadores do cérebro dos outros. Cucos.
Cresci, tive o grato prazer e a honra de ter sido Oficial Miliciano subalterno de Salgueiro Maia. Obrigado! Homem verdadeiramente humano. Cresci, e de quando em vez ainda dou uns abraços a Vasco Lourenço. Homem Grande, todo Grande, parece que nem cabe dentro dele próprio.
Cresci e conheci militares de Abril aos quais me curvo, sem medo, mas por gratidão e reconhecimento.
Viva o 25 de Abril! Viva A República! Viva Portugal!

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