Terapia
do sono.
O Jaquim, da minha terra,
acercou-se choroso e constrito, de mim.
- Que te fizeram Jaquim? –
Perguntei.
- Sabes Bigorna, fui ali para um
semáforo, cá da nossa capital, que é cá “qa gente” vai gemendo e chorando, neste
vale de lágrimas, e aproveitei a paragem de um carro (daqueles que pagam mais
de IUC que nós ganhamos por mês), e acerquei-me do vidro. O senhor condutor
abriu e vidro e perguntou-me “Que queres tu?” Ao que eu respondi “uma esmolinha…”
- E para que queres tu a esmola?
- É por mor de comprar uma sandes.
- Sabes que horas são?
- Não tenho relógio, mas pelo buliço
do trânsito devem ser 6 da tarde.
- Pois! Se comes agora uma sandes
perdes o apetite para o jantar. Fica para outro dia.
Não sendo eu dos melhores, ouvi a
história do Jaquim e só pensei em vir para o Facebook. Confesso que me esqueci
de lhe dar umas moedas para que ele comesse qualquer coisita.
Estava eu para escrever esta
história e as notificações de notícias trouxeram-me este excerto:
“Nós precisamos muito da vossa ajuda. Precisamos de
ajuda material, de dinheiro”, pediu esta quarta-feira o presidente da Fundação
JMJ, D. Américo Aguiar, diante de cerca de três dezenas de empresários
cristãos.
Durante um almoço organizado pela ACEGE (Associação Cristã de Empresários e
Gestores) na Igreja de São Nicolau, em Lisboa, o Bispo Auxiliar de Lisboa
referiu que precisaria de 20 milhões de euros em donativos para “dormir
sossegado” em relação à organização do evento.
(https://rr.sapo.pt//...)
Afinal dormir descansado é fácil.
(Desenho de Bigorna - que vê mal, desenha pior e tem sono) |
Vinte Milhões também deveria dar
para, talvez uns milhares, de pessoas, que não conseguem ter casa decente,
dormirem sossegados. Mas vai tudo para os soporíferos…
Eu compreendo. Eu também não gosto
de pobres. Sempre a pedirem nos semáforos, sempre a quererem comer, sempre a
quererem ter uma casita… Vão mas é trabalhar. Se lhes dão alguma coisa perdem
logo a vontade de trabalhar. Só lhes falta pedirem para ir para o céu dos
cristãos (para o mesmo céu dos tais empresários cristãos…), e se calhar às 6 da
tarde, hora em que não dá jeitinho algum.
- Oh Jaquim! Conheceste o tal
figurão do carro, do semáforo?
O Jaquim demorou a responder.
Mordiscou os lábios. E, depois de voltar o olhar para as recordações do fundo
do seu cérebro, respondeu:
- Não. Eu, com fome, fico meio cego…
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