domingo, 7 de maio de 2023

 

Terapia do sono.

 

O Jaquim, da minha terra, acercou-se choroso e constrito, de mim.

- Que te fizeram Jaquim? – Perguntei.

- Sabes Bigorna, fui ali para um semáforo, cá da nossa capital, que é cá “qa gente” vai gemendo e chorando, neste vale de lágrimas, e aproveitei a paragem de um carro (daqueles que pagam mais de IUC que nós ganhamos por mês), e acerquei-me do vidro. O senhor condutor abriu e vidro e perguntou-me “Que queres tu?” Ao que eu respondi “uma esmolinha…”

- E para que queres tu a esmola?

- É por mor de comprar uma sandes.

- Sabes que horas são?

- Não tenho relógio, mas pelo buliço do trânsito devem ser 6 da tarde.

- Pois! Se comes agora uma sandes perdes o apetite para o jantar. Fica para outro dia.

Não sendo eu dos melhores, ouvi a história do Jaquim e só pensei em vir para o Facebook. Confesso que me esqueci de lhe dar umas moedas para que ele comesse qualquer coisita.

Estava eu para escrever esta história e as notificações de notícias trouxeram-me este excerto:

“Nós precisamos muito da vossa ajuda. Precisamos de ajuda material, de dinheiro”, pediu esta quarta-feira o presidente da Fundação JMJ, D. Américo Aguiar, diante de cerca de três dezenas de empresários cristãos.

 

Durante um almoço organizado pela ACEGE (Associação Cristã de Empresários e Gestores) na Igreja de São Nicolau, em Lisboa, o Bispo Auxiliar de Lisboa referiu que precisaria de 20 milhões de euros em donativos para “dormir sossegado” em relação à organização do evento.

(https://rr.sapo.pt//...)

Afinal dormir descansado é fácil.

(Desenho de Bigorna - que vê mal, desenha pior e tem sono)
Para o Jaquim da minha terra, de barriga vazia, não. Mas para o Senhor D. Américo Que já andava sem sono por causa dos palcos papais, 20 milhos são um excelente soporífero.

Vinte Milhões também deveria dar para, talvez uns milhares, de pessoas, que não conseguem ter casa decente, dormirem sossegados. Mas vai tudo para os soporíferos…

Eu compreendo. Eu também não gosto de pobres. Sempre a pedirem nos semáforos, sempre a quererem comer, sempre a quererem ter uma casita… Vão mas é trabalhar. Se lhes dão alguma coisa perdem logo a vontade de trabalhar. Só lhes falta pedirem para ir para o céu dos cristãos (para o mesmo céu dos tais empresários cristãos…), e se calhar às 6 da tarde, hora em que não dá jeitinho algum.

- Oh Jaquim! Conheceste o tal figurão do carro, do semáforo?

O Jaquim demorou a responder. Mordiscou os lábios. E, depois de voltar o olhar para as recordações do fundo do seu cérebro, respondeu:

- Não. Eu, com fome, fico meio cego…


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