Aos que me têm
Estão a chegar dias de celebrações de vivos e de mortos.
Há uma fusão intensa, de sentimentos quando se celebra o dia dos Santos e o dia dos Finados.
Muito embora haja religiões que ajudam a confundir e obscurecer estes conceitos, no coração das pessoas não há confusões.
No meu coração há vivos que estão mortos, mortos que estão vivos, vivos que são santos, santos que nunca viveram e há, ainda, todos os que quero conhecer.
Dentro do meu peito, caixa onde o meu cérebro mais anuncia as emoções, por ser nele que o coração acelera e a respiração quase para, cabem muitos, habitam saudades e moram tristezas e alegrias.
Aqui vivem muitos animais, alguns humanos. Aqui esvoaçam algumas das minhas mortes, muitas delas só transformações de matéria e energia… familiares, amigos, utentes… Animais de estimação, animais que matei por pura crueldade e até o cão que atropelei sem opção.
Assim sou cada vez mais gente e vidas dentro de mim… quanto mais gente e animais menos eu. Ou, talvez, mais um eu que somos os que em mim habitam.
Tenho medos e sei que lidarei mal com o sofrimento físico e até emocional. Mas, a morte, não me amedronta. Estou pronto.
Serei no coração de outros, como agora eles são no meu:
Quando Eu Morrer…
Quando eu morrer quero estar bem vivo,
quero ver passar a vida.
Quero que ela me diga bem alto
que parte sem ter pena
que se ausenta sem medo.
Quando eu morrer quero estar bem atento.
Quero ter tempo,
ouvir, na voz do vento, o doce rumor do firmamento.
Quando partir quero saber que parto,
degustar sábia e demoradamente o acto,
de olhos abertos,
para olhar o céu inteiro,
a terra, o mar e tudo quanto é verdadeiro.
Talvez só morra uma vez…
E tão sublime e especial momento
merece que eu esteja atento.
Não quero partir sem saber.
Quero dar a mim próprio alento,
fazer-me a despedida…
Pior do que deixar a vida
seria fazê-lo sem querer…
Bigorna (XXIX6023X)
(Fotografia do autor)
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